Há poucos meses, a perícia americana constatou que a morte do cantor e compositor Prince, ocorrida em abril último, foi causada por uma dose excessiva de opioide trouxe à tona o perigo que envolve o uso incorreto deste tipo de medicamento. Derivado do ópio, o opioide pertence a um grupo de medicamentos muito potentes, utilizados para a diminuição e até a eliminação de dores. São usados em casos de dor crônica e aguda, ambas intensas, em geral ligadas a doenças graves, como câncer, ou fraturas.
Uma de suas formas medicamentosas mais conhecidas é a morfina, encontrada em farmácias, segundo o anestesiologista José Luiz Gomes do Amaral, ex-presidente da Associação Médica Mundial e membro titular da Academia Nacional de Medicina. Ele considera este tipo de medicamento muito perigoso se utilizado sem acompanhamento adequado.
É claro que administração de opioide fora de um contexto hospitalar ou supervisionado é perigosíssima porque o opioide induz à depressão respiratória. A pessoa pode sofrer efeitos da hipoventilação e ter parada respiratória. A parada cardíaca vem na sequência.
Michael Jackson
O médico explica que, por serem potentes, tais remédios são utilizados inclusive em anestesias antes de cirurgias. A maior parte deles só é fornecida para uso hospitalar.
São utilizados com bastante frequência tanto em anestesia geral quanto local, uma vez que os opioides são administrados perifericamente, por exemplo, no canal vertebral, o que gera um efeito regional, segmentado.
Ele ressalta, porém, que, no caso da anestesia geral, há a necessidade de incluir outros fármacos, já que o opioide não tem como característica básica o poder hipnótico, para levar à perda da consciência. E não é recomendável, portanto, para acabar com a insônia.
No caso do cantor Michael Jackson, morto em 25 de junho de 2009, Gomes do Amaral afirma que a causa não teve relação com uso de opioide, mas sim com o de propofol, uma outra substância utilizada em anestesias.
O propofol sim tem uma atividade hipnótica muito intensa, o Michael Jackson costumava utilizar o propofol em casa e quem prescrevia era o médico que cuidava dele.
Conforme ele afirma, a analgesia (diminuição da dor) é um dos componentes anestésicos.
A anestesia é um conjunto de propriedades, uma delas é a diminuição ou abolição da dor, mas a anestesia também é entendida como abolição da consciência, além de também levar a um relaxamento muscular. Na anestesia geral buscamos todos esses efeitos, inclusive os analgésicos.
Dependência perigosa
Mas há um fator que torna o fármaco ainda mais perigoso, segundo atesta o psiquiatra Guido Palomba: é o alto risco de dependência causado por este tipo de medicamento, algo que possivelmente ocorreu na morte de Prince, em Minneapolis (EUA), cuja perícia divulgada no início de junho.
O opioide começa a ser usado por questão de dor, é um dos melhores analgésicos, quando nada mais funciona. Mas acontece que ele tem um poder de sedução, dá um bem-estar muito grande. O paciente começa a usar como analgésico mas o poder de sedução dele é dos maiores, a ponto de alguém tomar três doses e já querer tomar mais e não conseguir se libertar.
A diferença, segundo ele, em relação às drogas alucinógenas, como cocaína, heroína, LSD é que, além de ser um medicamento legalizado, o opióide não tira ou altera a consciência do usuário. No entanto, não deixa de exigir cuidados para que não haja dependência.
A pessoa se sente flutuando, fica etérea, com uma sensação de alívio e plenitude imensos, e, ao mesmo tempo, com os sentidos funcionando, não com alucinações. Há casos até de pacientes que inventam dores e vão ao hospital para continuarem tomando esses opioides. Pode-se dizer que se insere no pior tipo de dependência.
Neste caso, segundo Palomba, que é diretor da Associação Paulista de Medicina e membro emérito da Academia de Medicina de São Paulo, cabe ao médico estar atento para que, em casos de necessidade, o medicamento seja administrado com critério.
O uso de opioides necessita de cuidado, tanto é que a receita não é nem comum. Aqui no Brasil há a receita branca e a azul é utilizada para tarja preta. Para drogas como morfina a receita não é obtida facilmente. Se o uso é indicado, a morfina é administrada mas depois é necessário o chamado “desmame”. O médico inclui o fármaco no tratamento, o paciente vai pedir mais, mas o médico tem de administrar e ir tirando até sumir qualquer dependência. A crise de abstinência de opioides é fortíssima, no nível mais alto da abstinência, entre todos os tipos.
Segundo pesquisa do Journal of Pain Research 2015, o Brasil é um entre os 10 países que menos prescrevem opioides no mundo. Gomes do Amaral ressalta que, em países menos desenvolvidos, o uso de opioide tende a ser menor, por causa de um número inferior de receitas prescritas e do sistema de saúde menos acessível em relação a países desenvolvidos. Como explicação, ele acrescenta ainda o baixo grau de conscientização da população em relação aos perigos que esta droga tem em caso de uso indiscriminado.
Fonte: Noticias R7