Disponibilização de novas terapias – Desencadeada por uma reação do sistema imunológico, a retocolite ulcerativa é uma doença crônica caracterizada por inflamação do intestino grosso e com manifestações extra intestinais. “Diarreia recorrente e persistente, com duração maior de 2 ou 3 semanas, associada à dor abdominal, são as manifestações mais comuns”, diz o coloproctologista Rogerio Saad, presidente do Grupo de Estudos da Doença Inflamatória Intestinal do Brasil (Gediib). Com o passar do tempo, continua o médico, a pessoa pode perder peso, e apresentar sinais de cansaço, fraqueza e anemia.
“É uma doença que, quando não bem tratada, afeta profundamente a qualidade de vida dos pacientes”, complementa a gastroenterologista Marta Brenner Machado, presidente da Associação Brasileira de Colite Ulcerativa e Doença de Crohn (ABCD). “E a retocolite ulcerativa atinge principalmente a faixa etária em que as pessoas estão em pleno período produtivo, entre os 18 e os 50 anos, podendo gerar incapacitações. As idas ao banheiro inúmeras vezes por dia acabam comprometendo o planejamento e o desempenho das atividades, levando ao isolamento profissional e social. É como se os pacientes vivessem num cativeiro”, descreve Marta Machado, que é também professora da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul.
Além do impacto financeiro nos sistemas de saúde, estudos mostram que a retocolite impõe um custo indireto também às empresas em razão do absenteísmo: a cada cinco anos de vida da pessoa com essa condição, ocorre um tempo médio de quase um ano de falta ao trabalho em razão das sucessivas crises.
O manejo ideal
“Quanto mais precocemente se intervém para conseguir a cicatrização da mucosa do intestino, maior a chance de mudar a história da doença, reduzindo seus impactos na vida do indivíduo”, afirma Marta Machado. Daí a importância de fazer o diagnóstico correto, por meio de histórico de sintomas, avaliação física e exames laboratoriais e de imagens radiológicas e endoscópicas com biopsias para estudos histológicos para detectar a atividade inflamatória. É importante também fazer o estadiamento, ou seja, a classificação da retocolite entre leve, moderada ou grave – o que vai direcionar o plano terapêutico.
“Nas últimas décadas, surgiram novas linhas de tratamento, como a terapia biológica, indicada para casos moderados a graves. E isso mudou o cenário. Hoje o paciente conta com algo fundamental: ele tem esperança. Esperança de voltar a ter uma vida normal”, avalia a médica. Isso porque essa classe inovadora de medicamento é capaz de atuar em alvos específicos responsáveis pela inflamação no intestino. “Nas doenças inflamatórias intestinais (DIIs) como a retocolite ulcerativa, os biológicos alcançam uma taxa de resposta, considerada razoável, mas não existe uma única medicação que funcione para todos”, pondera Rogerio Saad. “Por essa razão são desenvolvidos medicamentos com novos mecanismos de ação e novas moléculas. Quanto maior for o arsenal terapêutico disponível, maior a possibilidade de sucesso no tratamento, o que chamamos de individualização do tratamento”, completa.
Marta Machado ressalta ainda que a entrada de novos medicamentos é crucial também para aqueles que vinham conseguindo controlar a doença com alguns dos biológicos em uso, mas eles deixam de fazer efeito.
Acesso a inovações
“Hoje, felizmente, os pacientes estão cada vez mais bem informados. Assim, no momento em que chega uma molécula inovadora, e ela é aprovada para retocolite no Brasil, a pessoa que passou por várias outras terapias sem sucesso quer ter acesso a esse novo remédio”, pondera Marta Machado.
Por essa razão a ABCD vem incentivando a participação de todos na consulta pública a respeito do parecer preliminar da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) desfavorável à inclusão de um novo tratamento para retocolite no rol de cobertura dos planos de saúde.
Antes deste parecer desfavorável à inclusão do novo tratamento pela ANS, o Comitê Permanente de Regulamentação da Atenção à Saúde (ConaSaúde) fez uma reunião, na qual a maioria das cadeiras votou a favor da incorporação.
“É fundamental que todos participem dessa consulta pública. Os pacientes podem dar sua visão, relatar o que vivenciam quando as terapias atuais não funcionam para eles”, justifica a médica. “Afinal, estamos lidando com uma doença que em alguns casos tem o manejo muito difícil. A inflamação contínua, sem tratamento adequado, aumenta em dez vezes o risco de câncer de intestino. Por vezes, obriga a uma retirada de todo o órgão”, exemplifica. “Mesmo uma cirurgia radical nem sempre consegue resolver o problema”, lembra Rogerio Saad. “Isso sem contar o impacto na qualidade de vida de quem passa por uma cirurgia desse tipo”, conclui.
“No momento em que chega um medicamento novo para uma doença que não está bem controlada com os medicamentos convencionais, e inclusive com perda ou não resposta aos novos biológicos e pequenas moléculas, é um direito do paciente, e também do médico, fazer uso dela. É o que chamamos de decisão compartilhada”. – Marta Brenner Machado, presidente da Associação Brasileira de Colite Ulcerativa e Doença de Crohn (ABCD)
Referência
1 Froés, R. S. B., et al., The socio-economic impact of work disability due to inflammatory bowel disease in Brazil, 2017.