Na última terça (22/04), o Conselho Nacional de Saúde (CNS) deu continuidade ao ciclo de debates intitulado “Ocupação Preta: Rodas Virtuais sobre Equidade e Saúde”, que traz uma série de especialistas negros e indígenas para debaterem o Sistema Único de Saúde (SUS) e a coleta de dados das populações subalternizadas. O descuido com o quesito raça/cor vulnerabiliza ainda mais negros e indígenas no Brasil. O evento foi transmitido no Facebook e Youtube do CNS.
Cinthia Vilas Boas, integrante da Comissão Intersetorial de Políticas de Promoção da Equidade (Cippe) do CNS, durante a mediação do debate, explicou. “Estamos aqui para enegrecer o espaço, para falar o que a branquitude não quer escutar. Somos dores que gritam o valor da vida. Nós queremos respirar”, disse.
Jupiara Castro, coordenadora-adjunta da Cippe, comissão que organiza as atividades, disse que é fundamental que os gestores do governo federal sejam julgados por “crimes contra a humanidade”. Diante do cenário de pandemia negligenciada pelo Estado, “são negros e indígenas que estão alijados do direito à vida, sem renda para se alimentar”, afirmou.
Segundo Agnes Rangel Camissão, coordenadora do grupo de pesquisa Leodegária de Jesus, a morte por Covid-19 no Brasil tem cor. Por isso, é necessário que o quesito raça/cor seja adequadamente preenchido nos protocolos do SUS. “Há uma dificuldade de os indivíduos em se autodeclarar pela falta de entendimento das cores e raças no país. Os profissionais de saúde precisam ser capacitados para fazer esse questionamento. Saber essa informação é uma questão de saúde. Em algumas populações há prevalência de doenças, como a diabetes e hipertensão em população negra, por exemplo”, disse.
Ana Lúcia Paduello, conselheira nacional de saúde que também integra a comissão, trouxe o levantamento realizado pela Agência Pública no último mês. Os dados mostraram que, até março, havia cerca de duas pessoas brancas para cada pessoa negra vacinada contra a Covid-19. A diferença nos dados de vacinação entre brancos e negros é ainda mais grave devido à desigualdade da mortalidade pela doença no Brasil. Das pessoas que tiveram a doença no país, há proporcionalmente mais mortes entre negros do que entre brancos. “Na lógica, a população negra poderia ter tido uma cobertura superior. A pandemia está escancarando o racismo que a sociedade não consegue empurrar pra debaixo do tapete”, criticou.
Silvia Viana, docente do Departamento de Saúde Pública da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), disse que “precisamos discutir equidade” na gestão pública. Para ela, “temos que relembrar toda a historia do movimento social negro e indígena. Não podemos deixar de lembrar do Estatuto da Igualdade Racial, das políticas de promoção de equidade. Precisamos exigir a implementação delas nos territórios. O racismo impacta na saúde, na doença e nas mortes das pessoas”, completou.
Subnotificação entre indígenas
A subnotificação entre indígenas também se evidencia. De acordo com Angatu Xukuru Tupinambá, docente da Universidade Estadual Santa Cruz (Ilhéus), o governo não percebe a diversidade dos povos indígenas no Brasil. “Temos indígenas com fenótipo de negro, mas as gestões federais não levam em consideração a autodeclaração”. Segundo ele, a Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), do Ministério da Saúde, só levam conta os indígenas que estão nos Distritos Sanitários Especiais Indígenas (Disei). “Os indígenas nas cidades não são considerados”. Angatu afirmou que 36% dos indígenas moram em cidades. Ou seja, não fazem parte das políticas de saúde da Sesai.
De acordo com informações da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), 52,7 mil casos de Covid-19 foram confirmados entre essa população. Mas a Sesai aponta menos: 46,8 mil. O mesmo ocorre quando o assunto é referente aos óbitos. A Sesai mostra 640 óbitos por Covid-19, enquanto a Apib aponta 1.041 óbitos entre indígenas no país.
Fotos: OpenDemocracy e Mundo Negro
Fonte: Ascom CNS