Se Nilton Rocha, 55, não injetar um remédio após a hemodiálise, o sangue dele coagula; Geraldo da Cruz, 72, corre o risco de ficar anêmico por conta de insuficiência renal; e Aureliana Reis, 41, precisa tomar um medicamento diário para não ter dores ocasionadas pelo lúpus. Esses pacientes deixaram a Farmácia de Minas, na última terça-feira, com um carimbo escrito “Falta” em suas receitas. Alguns saíram de longe sem saber que a unidade, no bairro Santo Agostinho, na região Centro-Sul da capital, está sem algumas drogas. Dez pessoas ouvidas pela reportagem não encontraram suas prescrições no local, que é responsável pela distribuição gratuita de remédios para pacientes com doenças específicas ou raras.
Quem precisa do medicamento sabe da importância de usá-lo rigorosamente e, por isso, está assustado com a possibilidade de ficar desassistido pelo governo. O problema já vem ocorrendo há cerca de dois meses para alguns, ou pela primeira vez para outros, o que faz com que eles temam a chegada de 2017 – no próximo ano pode ser pior. Por enquanto, alguns ainda têm um pouco em casa, mas receiam que acabe antes de o fornecimento ser regularizado.
Outros vão dando um jeitinho de pagar por enquanto; o que não será possível por muito tempo, já que são medicamentos caros, algo que varia, por mês, entre R$ 100 e R$ 500, e a população que depende do SUS não têm condições de arcar.
O pintor aposentado por invalidez José Pereira de Oliveira, 69, está preocupado, porque ficou sabendo que a caixa de seu remédio, em falta na Farmácia de Minas, vai aumentar de cerca de R$ 50 para R$ 80 em janeiro. “Já tem um mês que eu estou comprando. Tomo quatro caixas de gabapentina por mês por causa de um problema na medula. Sem a droga, eu tenho dormência, formigamento e dor crônica”, falou, com a receita na mão, válida até o dia 29 deste mês, na esperança de que o remédio chegue na semana que vem.
Resposta. A Secretaria de Estado de Saúde (SES-MG) informou que, dos dez remédios listados pelos pacientes (veja abaixo), um não estaria em falta e dois já foram comprados e terão a entrega regularizada na próxima semana. A pasta ponderou que “a escassez de recursos financeiros disponíveis tem impactado o pagamento aos fornecedores, os quais não efetivam a entrega dos itens até que a quitação seja regularizada. Tal fato culminou no desabastecimento destes medicamentos”, diz a nota. “Ressaltamos que a SES-MG entende que é de suma importância o fornecimento regular desses medicamentos e está empenhando esforços para a normalização o mais breve possível”, concluiu.
A secretaria orienta entrar em contato com o LigMinas pelo 155, escolher a opção 2, em seguida a opção 4 (Farmácia de Todos), para acompanhar a entrega dos medicamentos.
Pacientes formam grupos e se ajudam
Enquanto os remédios não chegam, um grupo de WhatsApp de amigos de doenças autoimunes, que fazem tratamento no Hospital das Clínicas, se ajuda compartilhando os estoques dos medicamentos que eles precisam tomar, mesmo correndo o risco de faltar para todos depois. “A gente também posta pelos Correios para pacientes de outros Estados que precisam”, contou a telefonista Aureliana Reis, 41.
Os companheiros de hemodiálise também são solidários na troca, pois sabem que cada ampola da droga que eles injetam pelo menos três vezes por semana chega a custar R$ 50. “A gente vai contando com doação de amigos, que emprestam remédios na esperança que chegue depois”, afirmou Maria da Penha da Cruz, 69, mulher de Geraldo, que faz tratamento de diabetes há sete anos e, pela primeira vez, enfrenta a falta da droga.
Além dos medicamentos especializados utilizados no tratamento de doenças específicas ou raras como artrite reumatoide, Alzheimer, esclerose e Parkinson, o programa Farmácia de Todos realiza a distribuição de medicamentos básicos e de alto custo – segundo a SES-MG, são cerca de 340 itens contemplados em 261 municípios. (JS)
LISTA DE MEDICAMENTOS
Veja a lista de remédios não encontrados por pacientes ouvidos no dia 20 de dezembro na Farmácia de Minas (av. do Contorno, 8.495, no bairro Santo Agostinho). Na sequência está a resposta da SES-MG para cada situação e também o preço médio encontrado em drogarias consultadas pela reportagem:
Sacarato de hidróxido de ferro (R$ 50), gabapentina 400 mg (mesmo princípio ativo do Gabaneurin – R$ 82,68), atorvastatina 20 mg (R$ 42,34), topiramato (R$ 18) e ciprofibrato 100 mg (R$ 32,95)
Resposta: Tão logo os itens sejam entregues, será autorizada a distribuição a todas as regionais de saúde do Estado.
Lamotrigina 100 mg (R$ 36,91) e ambrisentana 10 mg (não foi encontrado em três drogarias)
Resposta: Foram entregues recentemente pelos fornecedores. Uma distribuição complementar está em fase de autorização. A previsão de entrega para Belo Horizonte é até o início da próxima semana, conforme quantidade solicitada.
Alfaepoetina 4.000 UI – (R$ 39,89)
Resposta: o remédio tem sua aquisição centralizada pelo Ministério da Saúde (MS), ou seja, a compra é realizada pelo MS, e este distribui aos Estados. Os medicamentos foram solicitados ao MS conforme cronograma previamente definido por ele. A SES-MG aguarda entrega pelo Ministério da Saúde.
Alfaepoetina 1.000 UI (é a eritropoietina humana – R$ 237,49, com seis seringas)
Resposta: não está em falta na regional de Belo Horizonte.
Alendronato 70 mg – (R$ 22,49);
Resposta: faz parte do componente básico da assistência farmacêutica, sendo disponibilizado nos postos de saúde municipais.
Resposta da Secretaria Municipal de Saúde de Belo Horizonte: “indicado para o tratamento de osteoporose, o abastecimento está irregular devido ao atraso na entrega pelo fornecedor. A SMSA já tomou as medidas administrativas cabíveis, como multa e notificações à empresa, para resolver essa situação”.