A Gota é uma artropatia inflamatória ocasionada por depósito e formação de cristais de urato monossódico hidratado em tecidos articulares. Uma doença muito antiga. É muito dolorosa e incapacitante, podendo haver crises repetidas e após algum tempo, tornar-se crônica. A prevalência varia geograficamente, dependendo da coleta de dados. Oscila na faixa de 1 a 5%. A incidência é de 2,9/1.000 pessoas.
Nas últimas décadas, observou-se um aumento da prevalência da gota devido ao Diabetes, por maior ingesta de proteínas, bebida alcoólica, bebidas adoçadas e frutose; aumento da expectativa de vida, ou seja, a população está vivendo por mais tempo; uso de medicamentos que elevam o ácido úrico no sangue (diuréticos e AAS); doença renal crônica e síndrome metabólica (aumento de colesterol e triglicerídeos no sangue). Entre os 60 e 69 anos a prevalência pode ser acima de 8%. A predominância é no sexo masculino, em proporções de 7:1 a 9:1. A maior incidência ocorre entre os 30 e os 60 anos.
Quadro clínico
Diariamente, o ser humano ingere alimentos que contém proteína, que metabolizam a purina. O resultado da metabolização dessa substância é o ácido úrico. Esse procedimento é considerado normal e não apresenta riscos quando a quantidade de ácido úrico é mínima (dentro dos padrões) e ele é excretado, contando com o bom funcionamento de diversas partes do corpo, como os rins — que realizam a eliminação por meio da urina. O problema acontece quando há excesso de ácido úrico e a cristalização dele.
A gota é resultado do acúmulo de ácido úrico dentro da articulação (partes que funcionam como ‘juntas’ do corpo) e é uma das artrites inflamatórias mais comuns em todo o mundo. Ou o corpo produz a substância em quantidades demasiadamente altas, ou não consegue excretá-las o suficiente para manter o organismo saudável. Ocorre por conta do acúmulo e cristalização do ácido úrico nas articulações, o que se dá em paralelo com o aumento da substância no sangue — processo chamado de hiperuricemia. Para entender, então, o que causa a gota é preciso conhecer as causas do aumento exacerbado e a retenção do ácido úrico no corpo.
Muitos pacientes de hiperuricemia (aumento de ácido úrico no sangue) convivem sem apresentar complicações da formação de cristais de urato, como artrites ou cálculo renal. São as hiperuricemias assintomáticas. Porém, estes pacientes apresentem maiores riscos de hipertensão arterial, insuficiência renal e doenças cardiovasculares.
A gota articular costuma acometer pacientes masculinos, começando na quarta ou quinta década de vida, na forma de artrites agudas intermitentes, acometendo as articulações dos pés. Em mais da metade dos casos, as primeiras artrites ocorrem na articulação do primeiro dedo dos pés, que leva o nome de podagra.
As crises agudas evoluem rapidamente com dor intensa e eritema local, com grande hipersensibilidade ao toque. Essas primeiras crises respondem bem aos chamados anti-inflamatórios. Segue um período assintomático que pode durar meses. Caso a doença não seja tratada adequadamente, a partir desta fase, as crises tendem a ser mais frequentes e prolongadas, levando a um quadro crônico e progressivo, com sequelas e deformidades. Nesta fase, começam a aparecer os depósitos de urato denominados tofos, que podem ocorrer em qualquer lugar do corpo, mas são mais comuns em torno das articulações e notadamente em cotovelos.
Exames laboratoriais
Durante as crises agudas de gota, os exames medem a inflamação e se estão elevados: a hemossedimentação e a proteína C reativa. O ácido úrico, nas crises, pode ou não estar elevado, pois depende de sua diluição no sangue e nas articulações. O diagnóstico definitivo é dado pelo a fresco do líquido sinovial, com a presença de cristais em forma de agulha. Microscópios especiais equipados com filtros polarizados facilita a detecção dos cristais. Este exame pode ser realizado em materiais dos tofos e tecidos moles inflamados.
Exames de imagem
O ultrassom tem sido cada vez mais valorizado pela sua sensibilidade e especificidade, mesmo em fases iniciais. A tomografia computadorizada permite detectar depósitos incipientes de cristais.
Tratamentos
Durante a crise aguda de gota, o paciente deve ser orientado a identificar os primeiros sinais e sintomas e imediatamente, iniciar seu tratamento, preferencialmente nas primeiras 24 horas, sempre com orientação do reumatologista. Repouso relativo, evitando toda e qualquer sobrecarga que aumente a dor na região acometida e compressas com gelo local são medidas que auxiliam.
Para ao tratamento farmacológico utilizam-se os anti-inflamatórios não hormonais, colchicina ou corticosteroides (intramuscular ou intra-articular). Os anti-inflamatórios não hormonais não podem ser utilizados em pacientes com comprometimento renal, e mesmo pacientes que não tenham este comprometimento devem ser acompanhados periodicamente para não desenvolverem insuficiência renal.
O controle adequado da hiperuricemia (aumento de ácido úrico no sangue) é a melhor forma de prevenção de novas crise agudas. Dieta hipocalórica, com baixo teor de purinas (proteínas) e uma redução no consumo de álcool, refrigerantes e bebidas energéticas com alto teor de frutose.
O tratamento sempre é individualizado, controlando as comorbidades que cada paciente pode apresentar como hipertensão arterial, diabetes, insuficiência renal, obesidade, distúrbios metabólicos e cardiovasculares.
Medicamentos chamados uricoredutores estão indicados para pacientes que apresentem: tofos, dano articular radiográfico, duas ou mais crise de gota aguda em um ano. Estes casos são mais graves e a medicação tem que ser reajustada periodicamente pelo reumatologista. Em pacientes com hiperuricemia assintomática não é recomendado os uricoredutores.
Dr. Marco Antônio Araújo da Rocha Loures é reumatologista e presidente da Sociedade Brasileira de Reumatologia (SBR).
Fonte: Assessoria de Imprensa