Ele tem uma aparência inofensiva mas o seu veneno está entre os mais letais que se conhecem na natureza. Um búzio marinho, que ostenta o nome científico de Conus geographus, pode ser uma ajuda preciosa no tratamento da diabetes, já que os componentes tóxicos que segrega para imobilizar as presas ou predadores estão sendo estudados para uma futura utilização em novos medicamentos. Esse veneno, que é lançado como se fosse um dardo pelo búzio para atordoar outros animais, e permite desenvolver uma insulina ultrarrápida para tratar diabéticos, tratando-se do mais recente exemplo das potencialidades terapêuticas em torno dos venenos que estão presentes no meio ambiente.
Este molusco de cores vivas que habita os recifes dos oceanos Índico e Pacífico está sendo estudado por uma equipe de investigadores australianos e americanos que chegaram à conclusão de que o nível de insulina que ele produz atua três vezes mais rápido do que aquela que é produzida pelo corpo humano, segundo um artigo publicado na Nature Structural and Molecular Biology.
Os investigadores tentam agora fabricar uma insulina sintética semelhante à que é gerada pelo búzio. “Estamos tentando que seja mais ativa mantendo a sua rapidez”, explicou Helena Safavi, investigadora da Universidade de Utah (Estados Unidos) e coautora da investigação.
Nos peixes, o efeito do veneno é instantâneo porque penetra através das guelras, mas nos humanos será preciso mais tempo para atuar. Os investigadores apontam cinco minutos, enquanto os produtos mais rápidos que estão no mercado demoram 15 minutos para fazer efeito.
O estudo sobre o potencial terapêutico à boleia dos componentes tóxicos segregados por este animal marinho anima os investigadores, embora Helena admita que há um longo caminho a percorrer, porque um novo fármaco poderá demorar uma década a chegar ao mercado. Porém, desde a década de 70 que a indústria farmacêutica tem estado atenta ao desenvolvimento de novos fármacos baseados no veneno de alguns animais. E não faltam exemplares. Desde peixes venenosos, aranhas, serpentes, formigas, vespas, escorpiões ou lagartos.
Contudo, os caracóis marinhos, são conhecidas cerca de 800 espécies diferentes, onde podem ter uma grande diversidade de venenos de extrema potência, havendo alguns que conseguem mesmo ser dez mil vezes mais potentes que a morfina sem terem consequências viciantes, segundo uma investigação feita em 2014 na qual participou o geneticista português Agostinho Antunes. O estudo publicado na revista científica Nature Communications admitiu estar aqui um antídoto contra a dor crônica, mas já em 1981 a Agência do Medicamento dos Estados Unidos havia aprovado o captopril. Era o primeiro fármaco à base de veneno animal desenvolvido a partir das moléculas do veneno da serpente Bothrops jararaca, sendo indicado para a hipertensão. Seguiu-se aeptifibatida etirofiban, para síndromes coronárias agudas, bivalirudina para a coagulação do sangue durante as cirurgias, exenatida, para a diabetes tipo 2, batroxobin, para monitorizar o sangramento.
Neste momento são escassos os fármacos feitos à base de veneno de animais que estão aprovados mundialmente, embora existam numerosos componentes de venenos sujeitos a ensaios clínicos, segundo o investigador da Universidade de Queensland Glenn King no seu artigo publicado no Biological Therapy. Entre as possíveis aplicações dos futuros medicamentos, assegura o especialista, estará o tratamento do cancer ou da esclerose múltipla.
Fonte: Jornal DN