André Foligno descobriu a doença renal aos 28 anos. Conseguiu um transplante de rim doado pelo tio, mas quatro anos depois o corpo rejeitou o órgão e precisou ir para a hemodiálise. Ao lado do seu médico, o nefrologista Bruno Biluca, André completou os 42km da prova em 2023 e passou a ser um dos poucos renais crônicos do mundo com registro de ter concluído uma prova de longa distância. Ele segue na fila à espera de um novo transplante.
|
Quem decide correr os 42 km de uma maratona sabe que planejamento, disciplina e foco são fundamentais para alcançar o objetivo, expondo o corpo a treinamentos rígidos. E quando esse corpo já enfrentou um transplante de rim e sessões de diálise? É possível colocá-lo à prova? O paulista André Foligno, 40 anos, mostrou que sim. E sua história de superação é contada no emocionante documentário “Sobre Viver”, que revela o caso raro deste paciente com insuficiência renal que adotou a corrida de rua como estilo de vida. Não há nenhum registro na literatura médica, nem esportista, de um paciente renal que completou os 42km de uma maratona. Até então, o único registro oficial é de um renal britânico, que completou 30km. O reporte deste caso foi publicado na revista Hemodialysis Internacional em janeiro de 2023, assinado pelos médicos Sophie Kaarup, Henrik P. HANsen e Kristine Lindhard, do departamento de Nefrologia do Herlev Hospital, na Dinamarca.
Consultada pela equipe do documentário, a Confederação Brasileira de Atletismo informou que também não tem registro de nenhum outro paciente renal a completar uma maratona.
O filme dirigido por Rafael Pierini e Matheus Lopes, da produtora Red Cave, acompanha a trajetória de André do início do projeto até ele cruzar a linha de chegada da prova, realizada em 30 de julho de 2023, em São Paulo. Durante as gravações, a família do paciente destacou a força e a determinação dele para realizar um sonho que parecia impossível. Filho de um professor de educação física, André sempre gostou de praticar atividades físicas, mas após descobrir a doença renal, aos 28 anos, e ser submetido a um transplante, mas quatro anos depois o corpo rejeitou o órgão. André chegou a duvidar se poderia voltar a se exercitar como antes.
“Quando comecei a correr (com o intuito de suar e poder beber mais água) nem passou pela minha cabeça que a corrida se tornaria um estilo de vida, que me ajudaria tanto. E muito menos que eu conseguiria correr uma maratona. Me sinto orgulhoso e grato por ter a oportunidade de contar um pouco da minha história, de minhas lutas e vitórias. Espero que essa história consiga estimular pessoas em condições semelhantes a enxergar novas possibilidades para lidar com os problemas de forma mais leve e levar uma vida mais saudável”, diz André Foligno.
|
Médico se tornou parceiro na corrida de rua
O documentário “Sobre Viver” mostra também o empenho e a dedicação da equipe multidisciplinar da Fênix Nefrologia que começou a acompanhar André Foligno desde o início das sessões de hemodiálise. Ele conta que não teria conseguido realizar o projeto até o fim se não fosse o apoio do médico Bruno Piubelli Biluca, que se tornou seu parceiro nos treinos e correu ao seu lado durante a maratona.
|
“Foi ele que plantou essa ideia na minha cabeça e me deu total apoio, suporte e a segurança necessária para ir até o fim. Muitos fatores juntos contribuíram para o meu sucesso na prova, mas acredito que os principais foram a persistência e a determinação em seguir treinando mesmo quando tudo indicava que não seria
possível. E poder contar com pessoas incríveis que compraram a ideia”, lembra André, que já planeja novos desafios.
“Quero correr uma ‘major’ (circuito mais famoso do mundo que acontece em Berlim, Boston, Chicago, Londres, Nova Iorque e Tóquio) e correr uma maratona após o transplante. Quero ser um maratonista transplantado”, afirma André.
O médico, por sua vez, ressalta que essa aproximação com André foi resultado da empatia e compaixão praticada por toda a equipe assistencial que trabalha com pacientes em diálise. Emoção, orgulho e senso de responsabilidade tomaram conta dos profissionais, pois a condição clínica dele para a prova dependia do atendimento multidisciplinar ao paciente.
“É impossível não haver um relacionamento com os pacientes que fazem diálise, principalmente com os que fazem diálise todos os dias. Brincamos que esses pacientes são os únicos que têm contato com o seu médico no mínimo três vezes por semana. No nosso caso, ainda temos a paixão pela corrida e esporte, o que possibilitou essa ‘aventura’”, destaca o especialista em nefrologia.
Atividade física na rotina de paciente renal crônico
A história de André Foligno impressiona, mas será que a atividade física é recomendada para todo paciente renal? Segundo o médico Bruno Piubelli Biluca, é possível que o paciente, dentro de suas limitações, pratique exercícios físicos, a não ser que haja alguma condição clínica mais específica, como cardiopatia grave, hipotensão postural, amputação ou cegueira, que por vezes atingem pacientes com Diabetes Melitus tipo 1. No caso do André, a insuficiência renal foi causada por uma doença autoimune que levou o sistema imunológico do paciente a atacar o rim.
Entre os cuidados a serem observados estão a hidratação (caso o paciente não tenha diurese, ganha muito peso) e o acesso vascular. O cateter não pode ser molhado, nem com água nem com suor, pois há risco de infectar, já a fístula não pode receber peso pelo risco de trombose.
“O André percebeu que quando fazia atividade física apresentava muita sudorese e isso possibilitou que ele ingerisse mais água. Quando começou a treinar, ele se pesava antes da sessão de diálise, após a sessão e depois do treino para saber quanto peso perdeu e quando líquido ele poderia ingerir ao longo dos treinos e da corrida”, lembra o médico.
Tecnologia e tratamento individualizado
Além da persistência e da motivação de André, a tecnologia e o tratamento individualizado na Fênix Nefrologia foram determinantes para que o paciente conseguisse se estabilizar a ponto de completar a maratona. Ele é submetido a um tratamento de diálise com aquela que é considerada a melhor modalidade dialítica disponível no mercado – HDF diária, seis vezes por semana – associado a acompanhamento com nutricionista, psicólogo, fisioterapeuta e médicos especialistas em cardiologia, endocrinologia, nefrologia e médico do esporte.
Bruno Piubelli Biluca explica que a hemodiafiltração que André faz todos os dias na clínica, durante duas horas, possibilita que ele fique bem a ponto de seguir para o treino logo após as sessões. “Certamente pacientes que fazem hemodiálise convencional, em sessões de 4h de duração, não teriam a disposição necessária para enfrentar o período de treinamento intenso que uma maratona exige”, afirma o especialista.
Estudo sobre hemodiafiltração de alto volume – A doença renal crônica representa um desafio de saúde global, afetando cerca de 830 milhões de pessoas em todo o mundo, com quase quatro milhões de pessoas dependentes de diálise. No final de junho de 2023, foi publicado um estudo randomizado internacional na revista New England Journal of Medicine, que ratificou que a hemodiafiltração de alto volume reduz em até 23% o risco de morte de pacientes renais crônicos. Isso ocorre porque é um tipo de diálise cuja capacidade de filtragem de moléculas maiores do sangue é a que mais se aproxima do trabalho de um rim.
No Brasil, seu uso cresceu em 1000% nos últimos 5 anos, mas tendo como grande impulso de fato a incorporação no rol da ANS, há três anos. No entanto, são em torno de 4000 mil usuários, num universo de 154 mil renais crônicos no país. No SUS, por exemplo, apenas o Amapá oferece.
O estudo abrangeu um total de 1.360 pacientes em 61 centros em oito países europeus, acompanhados por uma média de 30 meses. O estudo CONVINCE foi liderado por pesquisadores da UMC Utrecht em colaboração com a University College London (UCL), Charité Universitätsmedizin Berlin, University of Bari, The George Institute for Global Health, Imperial College London e provedores de diálise Fresenius Medical Care, Diaverum e B. Braun Avitum. Embora a hemodiálise seja o tratamento padrão na maioria dos países, a hemodiafiltração permanece subutilizada em certas regiões e ainda não foi adotada em lugares como os EUA.
Fonte: Assessoria de Imprensa