Imagine acordar de manhã e não conseguir abrir a torneira para lavar o rosto, não poder abrir o pote de margarina nem segurar o bule de café para se servir. Pense que a impossibilidade dessas ações simples é devido aos seus dedos rígidos, que não dobram, e que cada articulação da sua mão dói.
Frustração, ansiedade, sensação de fracasso. É assim que 56% dos brasileiros que vivem com artrite reumatoide (AR) se sentem quando não conseguem completar atividades diárias. Além dos aspectos físicos, essa doença crônica, inflamatória e autoimune afeta a vida das pessoas em questões ainda incompreendidas por quem está ao redor.
“Isso compromete o humor, dá sensação de impotência, é a base que gera os estresses emocionais”, diz Livia Firmino Gonçalves, endocrinologista e gerente médica em imunologia da Eli Lilly Brasil.
A empresa realizou uma pesquisa qualitativa internacional, com nove países participantes, em que 1.916 brasileiros responderam a um questionário online. O objetivo foi avaliar quatro pilares (trabalho, relacionamentos, atividades e aspirações) e descobrir o que as pessoas realmente sentem e o que, de fato, importa para elas quando se trata de viver com artrite reumatoide.
Os resultados estão no site AR Importa e podem ser analisados por país, idade e gênero do paciente. Profissionais da saúde que tratam artrite reumatoide também responderam ao questionário.
Mal compreendidos
No geral, 60% dos pacientes acham que as outras pessoas não entendem os impactos da AR, nem mesmo os médicos. “A doença tem necessidades não atendidas apesar do tratamento. Isso mostra que precisamos rever nossa relação com o paciente, escutá-lo um pouco mais e não só olhar e ver (aparentemente) que está bem”, diz Rina Dalva Neubarth Giorgi, médica do serviço de reumatologia do Instituto de Assistência Médica ao Servidor Público Estadual (Iamspe).
A doença tem incidência maior em mulheres e tende a se manifestar entre os 30 anos e 50 anos de idade. Segundo a pesquisa, as pessoas mais jovens sentem que são menos compreendidas, principalmente nos aspectos emocionais. “A sociedade já espera um grau de limitação do idoso, mas a pessoa com menos de 40 anos é mal compreendida, principalmente no trabalho, pelo papel que exerce na sociedade”, diz Lívia.
Quem é diagnosticado com artrite reumatoide sente que a progressão na carreira é retardada, sendo que pacientes entre 40 e 59 anos são mais propensos a ter de se aposentar mais cedo. Pela importância que a sociedade dá ao fato de se ter um emprego, ficar sem ele pode trazer consequências sérias para o psicológico e emocional.
As dificuldades enfrentadas no presente comprometem as aspirações para o futuro, um dos pilares da pesquisa. Ter capacidade de permanecer ativo é visto como importante pelos pacientes e 64% deles gostariam de sentir que a AR dificulta suas vidas, mas eles a aceitam.
A reumatologista do Iamspe diz que ficou surpresa com os dados. Ela esperava que, com os tratamentos atuais para a doença, os pacientes não tivessem tantas queixas nos aspectos físicos. Os resultados apontam que as principais barreiras para realizar atividades diárias são articulações doloridas ou rígidas (57%), dor (56%) e fadiga (55%).
Realizar tarefas domésticas e, em maior grau, manter a higiene pessoal são as atividades que os pacientes consideram mais difíceis no dia a dia. Fazer exercícios físicos também é um problema. “A gente incentiva muito, dependendo do processo inflamatório e estando a doença controlada, com remédio, mas a pessoa não sente vontade, talvez seja cansativo para ela”, aponta Rina.
“Me impactou também como a doença ainda influencia de maneira negativa nos relacionamentos, seja com a família, amigos, colegas de trabalho ou cônjuges”, destaca a reumatologista. Entre os aspectos das relações que são afetados pela AR, o impacto na vida sexual é o mais prejudicado, seguido de eventos sociais e atividades familiares.
Mudanças
A gerente médica da Eli Lilly Brasil afirma que a comunicação entre médico e paciente é o primeiro passo para mudar esse cenário. “O médico precisa melhorar muito, mas o paciente precisa sentir que pode falar o que sente. Se o médico não a ouve, ela deve buscar outro apoio, como enfermeiros, associação de pacientes, o fisioterapeuta”, diz Livia. “O paciente precisa encarar a comunicação melhor”.
Livia considera que um dos trunfos da pesquisa nesse apoio ao paciente foi que, ao responder ao questionário, o resultado da pessoa podia ser comparado, em uma régua de medida, com a média de outros respondentes. “O resultado dela é acolhido por outras. Ela sabia que não estava sozinha”, destaca.
Fonte: Terra