Médicos começam a discutir abordagens que ajudem a evitar o surgimento da doença autoimune. A expectativa é de que, em um futuro próximo, indivíduos com perfil de alto risco possam ser assistidos.
Há pouco mais de 15 anos, receber o diagnóstico de artrite reumatoide significava, para o paciente, uma vida de dor, deformidades, perda de produtividade e limitações. Hoje, a doença permanece grave, mas conhecimentos aprofundados dos mecanismos que a conduzem — o que levou ao aprimoramento da abordagem terapêutica — permitiram que, em um intervalo curto de tempo, os prognósticos melhorassem significativamente.
Embora já seja possível atingir a remissão da doença e minimizar ou até evitar as comorbidades, ainda assim, 60% dos pacientes não respondem à medicação adequadamente. A mortalidade de pessoas com artrite reumatoide também é maior, comparada a quem não sofre dessa condição autoimune. É por isso que, além de insistir na necessidade de diagnosticar e tratar precocemente, o que retarda a evolução dos sintomas, os médicos começam a discutir a prevenção da doença reumática.
A ideia é que, em um futuro próximo, quem tem perfil de alto risco seja submetido a exames que detectam anticorpos e outras substâncias associadas à artrite reumatoide e possa receber intervenções para evitar que ela se manifeste. As possibilidades de prevenir a enfermidade foi tema de uma edição especial da revista Clinical Therapeutics, da editora Elvesier, na mesma semana em que se realizou, em Madri, o Congresso Europeu de Reumatologia.
A artrite reumatoide é uma doença autoimune, quando o corpo passa a atacar as próprias células por não reconhecê-las como parte dele mesmo. Esse processo está presente em todas as pessoas e é importante para varrer do organismo células defeituosas que são produzidas diariamente. Porém, no caso dos pacientes, mesmo as saudáveis são consideradas inimigas e combatidas por conjuntos do sistema imunológico.
Sinais precoces
Hoje, se sabe que, ao menos cinco anos antes de a doença sintomática de fato se instalar, há produção aumentada de algumas substâncias, detectáveis na corrente sanguínea. “A maior parte das doenças autoimunes só é identificada uma vez que o indivíduo fica ‘doente’.
Por exemplo, com a artrite reumatoide, quando a pessoa sente dor e tem inchaço nas articulações”, diz o médico Tsang Tommy Cheung, professor de medicina da Universidade de Hong Kong e um dos editores convidados da revista.
“Exames de sangue podem, agora, identificar aqueles em alto risco antes que se sintam doentes, abrindo um horizonte totalmente novo de triagem e possível prevenção. Tratar a artrite reumatoide muito precocemente pode permitir terapias mais baratas e seguras porque, quando a doença se desenvolve em toda sua forma, tipicamente precisamos de medicamentos muito poderosos para controlá-la”, explica o especialista.
Na edição especial da Clinical Therapeutics, pesquisadores sugerem a realização de estudos clínicos para avaliar se, uma vez identificados os pacientes em alto risco, sejam feitos testes com medicamentos usados hoje para tratar a doença já instalada, com objetivo de verificar se a estratégia pode evitar ou atrasar o desenvolvimento da artrite reumatoide. Eles destacam que, antes de transformar a prevenção em prática clínica, é preciso avaliar se os benefícios serão maiores que os riscos, já que todo remédio tem efeitos colaterais.
O reumatologista Levi Jales Neto, da Rede de Hospitais São Camilo, de São Paulo, afirma que alguns estudos-pilotos europeus já avaliaram o tratamento com imunossupressores antes da fase sintomática em pessoas predispostas e com anticorpos presentes. Porém, ele diz que os resultados foram insuficientes para se estabelecer um protocolo clínico.
“Os estudos tiveram como resultado o início mais tardio da doença. Mas, por submeter as pessoas a riscos de efeitos adversos da medicação, essa estratégia não é utilizada na prática clínica atual.”
“Exames de sangue podem, agora, identificar aqueles em alto risco antes que se sintam doentes, abrindo um horizonte totalmente novo de triagem e possível prevenção”, Tsang Tommy Cheung, professor de medicina da Universidade de Hong Kong.
Fonte: Correio Braziliense