“Quando se pensa na palavra sexualidade, isso foi um tema que foi falado na vida de vocês? Foi falado na família de vocês? Na minha casa se falasse isso levava era um tapa, ‘vai falar besteira para lá’”, arrancando risos da plateia foi assim que Geralda Sá, psicóloga abriu o Encontro Nacional de Pacientes Reumáticos, em Fortaleza, no Ceará, falando sobre um tema que ainda é permeado de tabus.
No contexto do paciente reumatológico, a sexualidade pode ser bastante afetada e negligenciada também. “A dor crônica acomete um número expressivo de pessoas, aproximadamente 60 milhões no mundo todo. Deste total, 50% apresenta algum tipo de comprometimento nas suas rotinas e, com certeza, na sexualidade”, alertou Geralda. Com isso pode surgir a disfunção sexual em homens e mulheres, que impacta diretamente na qualidade de vida e bem-estar.
Além disso, essa questão muitas vezes é deixada de lado. Com dores diárias e em muitos casos com dificuldades de mobilidade, a sexualidade fica em segundo plano na lista de prioridades ao lidar com uma doença crônica. Porém, não deve ser assim. A sexualidade é inerente à condição humana e vai além do ato sexual.
“A sexualidade é a energia que motiva a encontrar o outro. É o jeito de fazer? É o movimento? Não, é a pulsão. Às vezes ouço muito ‘Ah, Geralda, você vai falar de sexualidade, mas eu não tenho ninguém e nem quero mais namorar, então por que você fica falando sobre isso?’. Porque sexualidade é vida. Não é o ato apenas”, explica Geralda.
A sexualidade contribui para a resposta sexual que é caracterizada pelo desejo, excitação, orgasmo e resolução, que é a sensação de relaxamento e bem-estar geral. A disfunção sexual tem relação com o funcionamento inadequado de uma dessas fases que compõem o ciclo sexual.
Fatores de risco para a disfunção sexual
Classificada pela incapacidade de relacionamento sexual com satisfação, a disfunção sexual causa sofrimento pessoal e para ser diagnosticada precisa estar presente há pelo menos seis meses. Diversos fatores de risco podem prejudicar a excitação como distúrbios endócrinos, neurológicos e psicossociais. “Em geral, temos uma educação sexual precária, logo aprendemos que temos que nos entregar ao outro e satisfazê-lo, mas não a mim mesma”, comenta a psicóloga. Outros fatores como a vida sedentária, drogas e as doenças crônicas como depressão, ansiedade e estresse também influenciam diretamente na libido.
Trazendo para a realidade das doenças reumáticas, diversos estudos têm buscado avaliar a atividade sexual entre os pacientes. “Um estudo feito em 2009 com mais de 300 mulheres com artrite mostrou que ao passar do tempo há diminuição da satisfação sexual devido à dor crônica, fadiga, depressão e principalmente por conta da baixa autoestima”, destacou Geralda. Outro levantamento trazido pela psicóloga apontou que entre 68 mulheres com artrite reumatoide entrevistadas, 79,8% admitiu ter algum tipo de disfunção sexual.
Outra pesquisa que entrevistou mais de 30 mil mulheres na faixa etária de 25 a 65 anos apontou que a maioria sofria com a doença, com as dores físicas, com sentimento de isolamento e distanciamento em relação às atividades íntimas. O mesmo estudo mostrou que 40% das mulheres solteiras afirmaram que é mais difícil encontrar um parceiro, 22% das divorciadas disseram que a artrite teve papel na decisão de separar-se e 68% relataram esconder a sua dor às pessoas mais próximas, como o marido.
Para os pacientes com doença crônica, os principais fatores que prejudicam o desempenho sexual são a dor, fadiga, rigidez, ressecamento de mucosas, diminuição da libido, sequelas, efeitos adversos do medicamento, além de mitos e baixo auto-estima, entre outros.
A sexualidade termina por causa do diagnóstico?
Diante disso, questões como essa podem surgir e a resposta é não. A especialista destaca que experimentar novas formas de agir e sentir com relação ao outro com atitudes positivas e empatia e um caminho. “Desejo em primeiro lugar, carinho em segundo lugar, para termos desejo e chegarmos ao ciclo excitatório, nós precisamos de carinho, precisamos ter prazer, nos divertimos com a sexualidade e respeitar o outro…O afeto, o carinho, o lembrar, o compromisso são muito importante”, complementa.
Por que a pessoa com doença crônica deve exercer a sua sexualidade?
A resposta é simples: porque a pessoa não é a doença. “Você tem a sua identidade. Você não pode perder os seus prazeres da vida, seja eles quais forem, por conta de uma doença. A doença está, você não é”, alerta Geralda. A saúde sexual hoje é amplamente entendida como um estado de bem-estar e de saúde.
Diante disso, o tratamento passa primeiro por entender qual é a causa da disfunção. Com isso, medicamentos, psicoterapia, fisioterapia, orientação de casal, entre outras medidas podem ajudar a trazer e melhorar a relação sexual. É importante que o paciente converse com o profissional de saúde, ainda que muitas vezes não seja perguntado na consulta. No entanto, é preciso também que a pessoa assuma uma postura ativa de buscar solução sobre o problema. “Acima de tudo, é buscar auto-conhecimento. A sexualidade precisa de comunicação interna. É buscar diálogo com você mesmo. Para alguém gostar de você, primeiro você tem que gostar de você mesmo”, finalizou Geralda Sá.