Basta uma ligeira queda nas temperaturas e lá vem ela: a dor. Muitos dizem, inclusive, que o frio “ataca” quem tem doença reumática. Será verdade? A FOLHA conversou com especialistas em reumatologia que enfatizam que esse “ataque” é um mito, mas ponderam: a percepção de dor vai depender de cada paciente e das doenças que os acometem, pois reumatismo é um termo genérico para mais de 200 tipos ou subtipos de doenças reumáticas.
“Com a chegada do frio, a procura nos consultórios aumenta, o que nos dá a impressão que os pacientes sentem mais dor nesse período, mas não há uma explicação científica”, comenta a reumatologista Neide Tomimura Costa, professora-adjunta do departamento de clínica médica da UEL (Universidade Estadual de Londrina).
Porém, há três doenças do reumatismo que cursam no Fenômeno de Raynaud e que impactam sim os pacientes no que se refere à dor causada pela queda nas temperaturas. São pacientes com esclerose sistêmica, lúpus eritematoso sistêmico e osteoartrite (conhecida como artrose).
Quem pode contar um pouco sobre essa sensação é Ivone Barbosa de Oliveira, 42. Ela é moradora de Cambé (Região Metropolitana de Londrina) e foi diagnosticada com lúpus e esclerodermia há 10 anos. Há dois tipos de esclerodermia: a forma sistêmica (esclerose sistêmica) e a forma localizada, que é o caso de Oliveira.
A aposentada conta que demorou para controlar a doença e que faz uso de medicação diariamente. “Sempre tenho dores, mas quando esfria, piora. Sinto o corpo rígido, principalmente ao acordar. Não dá para cozinhar, lavar louça, fazer nada das tarefas de casa”, diz.
A dor de Oliveira piora porque as baixas temperaturas causam vasoconstrição, o que diminui o aporte sanguíneo para os tecidos. Esse é a característica do chamado Fenômeno de Raynaud. “A pele fica fria e gera uma área empalidecida bem demarcada ou uma cianose (coloração azul-arroxeada) nos dedos das mãos e dos pés. Algumas pessoas também sentirão a pele pálida e fria em orelhas, nariz, face, joelhos, ou seja, em qualquer área exposta”, afirma o reumatologista Marco Antônio Rocha Loures, presidente da SPR (Sociedade Paranaense de Reumatologia).
Ele destaca que a ocorrência de Raynaud é grave, pois, dependendo das lesões, a pessoa pode perder as extremidades dos dedos. A analista financeiro Itauana Morgenstern, 35, passou perto desse risco. “Levei três semanas para buscar ajuda e o médico me disse que se eu tivesse demorado mais três dias, eu poderia ter os dedos amputados”, conta. O primeiro sinal que ela sentiu da esclerose sistêmica foi o fenômeno de Raynaud.
No inverno de 2016, Morgenstern sentiu que os dedos da mão direita estavam gelados e com o passar dos dias foram ficando roxos e com fraqueza muscular. “Também senti dores no joelho, ombros, tornozelos e punhos. E logo comecei a sentir dificuldades na respiração”, lembra.
O diagnóstico concreto foi em fevereiro de 2017, pois até então havia apenas uma suspeita da doença. “Agora, mal começou a esfriar e as dores já voltaram no joelho. É como se as juntas estivessem enferrujadas. E os sintomas do Raynaud também voltam. Sinto uma ardência quando os dedos mudam de cor”, comenta ela, que mantém a página no Facebook “Quem disse que eu não posso?”.
O canal que tem quase cinco mil seguidores, foi o meio que Morgenstern encontrou para compartilhar sua experiência em relação à doença e desconstruir a visão que muitas pessoas têm em relação aos pacientes. “Quero mostrar que elas podem continuar fazendo o que gostam, dentro de suas limitações. Além disso, assim como toda doença, é preciso ter esclarecimento e divulgação para que todos possam buscar ajuda médica logo no início dos sintomas”, completa.
De acordo com Loures, o desafio das entidades brasileiras e internacionais em reumatologia é justamente fazer o diagnóstico e tratamento precoce com um especialista. “Porque, ao tratar, as lesões são reversíveis. Hoje, os pacientes já contam com um arsenal terapêutico satisfatório para impedir essas progressões”, destaca. De acordo com o Ministério da Saúde, aproximadamente 12 milhões de brasileiros são acometidos pelas doenças reumáticas.
Manter o corpo aquecido
Nas doenças reumáticas que sofrem influência do clima frio – lúpus, esclerose sistêmica e artrose – a primeira recomendação dos médicos é manter o corpo todo aquecido. Com as mãos, os cuidados incluem luvas de borracha ou uso de água quente para os afazeres diários.
Além de luvas, meias e agasalhos, quem estiver em boas condições de saúde também deve praticar atividade física que não tenha muito impacto nas articulações. Para isso, um médico reumatologista ou ortopedista poderá indicar a melhor modalidade de acordo com o quadro de cada paciente.
Pensando em manter o corpo aquecido, Itauana Morgenstern, que tem esclerose sistêmica, recorre às aulas de pilates. Ela mora em Curitiba, considerada a capital mais fria do País. “Fiz no inverno do ano passado e senti uma melhora significativa. Estou retomando as aulas pensando justamente na dor que tende a aumentar no frio”, conta.
Quanto ao uso de medicamentos, o reumatologista Marco Antônio Rocha Loures, presidente da SPR (Sociedade Paranaense de Reumatologia), lembra que cada doença se manifestará de forma diferente em cada paciente. “Nesses pacientes que são sensíveis ao frio justamente por apresentarem tais doenças, há a prescrição de vasodilatadores, além das recomendações gerais de manter as partes aquecidas e cuidados com a alimentação”, explica.
A vacinação contra a gripe também é importante. Segundo a reumatologista Neide Tomimura Costa, “a maioria dos pacientes pode ser vacinada mesmo usando medicamentos imunossupressores, mas é indicado consultar um reumatologista antes.”
Como essa enfermidades tendem a abaixar a defesa do organismo, o risco dos pacientes terem infecções como pneumonia, sinusite, gripes e resfriados é alto.
Fonte: https://www.folhadelondrina.com.br/saude/a-dor-que-piora-com-o-frio-1007080.html